quinta-feira, novembro 08, 2018

A Crise Académica de 62 e a Guerra Colonial


Ao longo deste mês de Novembro, ainda na ressaca das patetadas de praxes idiotas, algumas bem graves, seria de bom tom recordarmos que no século passado, anos 60, os nossos estudantes universitários lutavam por causas bem maiores. Causas que pediam uma coragem que anda meio esquecida... nesse aspecto, a Crise Académica de 1962 como ficou consignada na História, foi o primeiro caso grave de agitação estudantil sob o Estado Novo, e a primeira das grandes lutas de estudantes dos anos 60 em toda a Europa.


De volta dos meus papéis, e estudos, e livros, retiro das páginas de 'Moçambique para a Mãe se Lembrar como Foi', estas linhas:

25 de Novembro de 1961

'Em 1962, de Março a Junho, Portugal vivera quatro meses de crise estudantil, assinalados por plenários, manifestações de rua, greves aos exames e «luto académico», contagiando outras Universidades. Esta crise fora anunciada no jantar das comemorações do 25 de Novembro de 1961 que reuniu em Coimbra estudantes de todo ao país. Foi a primeira gota de água de uma caudalosa contestação que se prolongaria pelo ano seguinte. Tudo começou com mais de duzentas pessoas e um lema «Queremos Paz!», num coro de protesto contra a Guerra Colonial que inspirou um cortejo animado pela cidade de Coimbra, a que as forças policiais responderam como as mandaram responder, com espancamentos e prisões, que não conseguiram impedir uma vaga de apoio que os secundou por todo o país.

A tensão aumentou num crescendo que viria a eclodir em 1962 na cidade de Coimbra e em Lisboa. Para a história ficou o registo da repressão brutal exercida pela polícia de choque, que espancou manifestantes nas duas cidades, prendeu muitos, e expulsou muitos outros. A Crise Académica de 1962 como ficou consignada na História, foi o primeiro caso grave de agitação estudantil sob o Estado Novo, e a primeira das grandes lutas de estudantes dos anos 60 em toda a Europa[1].
Só nós, a maior parte de nós, não sabíamos nada disto, porque os jornais transmitiam a conta-gotas as noticias do que se passara, desvalorizando o número dos envolvidos e enquadrando os seus objectivos na generalizada designação de «arruaças» instigadas por «provocadores» mal-intencionados, inimigos da nação, a que não convinha dar crédito, porque os nossos governantes eram fortes, e já tinham tomado conta do assunto.

Mas, e uma vez mais… o que sabíamos nós, portugueses da metrópole, da África então portuguesa? Nada. Ou muito pouco. Uma coleção de estereótipos a legendar belas imagens mal coladas umas às outras, de onde se evolava o perfume da lonjura e da liberdade dos grandes espaços indómitos.
[...].'





[1] Em, por exemplo José Barreto, «O Islão do século XX’ e o comunismo do século XXI» em Villaverde, Manuel, e outros (org.), Itinerários: A Investigação nos 25 Anos do ICS. Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais, 2008, p. 793.

António Variações - É a Vida Alvim!


Fernando Alvim conversa com: Manuela Gonzaga, autora de "António Variações - Entre Braga e Nova Iorque"; Álvaro Lopes e Nuno Furtado, a propósito do Dance Summit. (em Canal Q).

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E no próximo sábado, em Serpa!



sábado, junho 16, 2018

Bondade de coração

Sermos defensores dos direitos dos animais implica, na minha opinião, sermos defensores dos direitos humanos e dos direitos ambientais. Seja qual for o vértice por onde se pegue, o equilíbrio entre os fatores é decisivo - para nós. Esta tomada de consciência deve, no meu entender, ou deveria ser enquadrada numa atitude de gentileza e compaixão por todos os seres, a começar por nós próprios, tão imperfeitos. 

Ora, uma das coisas que mais me perturba quando leio notícias que dão conta de maus tratos animais (sobretudo essas) é a terminologia com que os e as detratoras se referem ao ser humano no seu geral. A violência das palavras, o jorro de insultos, o desprezo, o asco, são tão terríveis que magoam só de ler. Eu, se pensasse assim sobre os seres humanos todos, humana que sou, matava-me sem contemplações. Mas acontece que felizmente, conheço direta ou indiretamente, ao longo da longa trama da nossa história, muitas criaturas sapiens sapiens de eleição. São meus e nossos faróis. Às vezes nem damos por elas, não fosse a alegria que lhes ilumina o rosto, iluminando, à sua passagem discreta, o mundo à volta.



Foto: Katrina Parry, Wales


sexta-feira, maio 25, 2018

Quem quer escrever romance histórico?

Amanhã, sábado dia 26, vou estar na Feira do Livro com a Isabel Valadão e o João Paulo Costa, para falarmos de romance histórico. E deixarmos pistas e segredos. Começa às 18.30.
Apareçam!

segunda-feira, maio 21, 2018

Ateneo Atlántico: Doida Não e Não!

«A partir dunha historia propia de folletín, comeza outra non menos real e épica: a loita dunha muller que durará anos e que se verá envolta en xuízos e diagnósticos nos que intervirán os mellores psiquiatras do Portugal do momento e que, un por un, confirmarán a enfermidade mental de Maria Adelaide, xustificando así, o mantemento do seu internamento.»








Ateneo Atlántico: Doida Não e Não!: Presentación do Libro Doida não e não! de Manuela Gonzaga O Ateneo Atlántico, xunto co Instituto Camões en Vigo e a Bertrand Editora,...

domingo, maio 20, 2018

'Doida não e não' Em Vigo

E em Vigo, onde chegámos ao fim da tarde, o dia estava luminoso e quente, o mar cintilante feito de prata, e a sala onde decorreu o evento, a encher... Foi no Camões, Centro Cultural Português, e foi maravilhoso. 'Doida nao e não!' está a ser lida por muita gente, e é livro do mês.

quarta-feira, maio 16, 2018

'Doida não e não' no Instituto Camões em Vigo

Rumo à Galiza, com a estória de uma mulher que fez e continua a fazer História.
A obra é livro do mês no curso de Português no Instituto Camões, em Vigo.
O evento tem a participação do Ateneo Atlântico.

quinta-feira, fevereiro 22, 2018

Os meus livros no Mar de Letras


Fica a entrevista que foi para o ar ontem na RTP ÁFRICA, programa Mar de Letras,  conduzida de forma excelente por Mário Carneiro. Doida não e não foi presente, mas o foco foram os meus livros em geral, e muito particularmente o romance Xerazade a Última Noite, bem como o último da saga de André, 'André e o Baile de Máscaras'.

Sinopse: «A escrita esteve sempre presente num percurso que passou pelo jornalismo, pela história e pelos livros. Manuela Gonzaga está de regresso ao "Mar de Letras". Um novo romance, a reedição de uma biografia e um livro de literatura infanto-juvenil são razões suficientes para não perder a conversa com uma escritora que dividiu a adolescência e a juventude entre Moçambique e Angola.»

quarta-feira, fevereiro 21, 2018

Mar de Letras e 'Agora Nós'

Logo à noite, vou estar no 'Mar de Letras', RTP África (21.30), entrevistada de forma exemplar por por Mário Carneiro. O mesmo programa será repetido a 24 de Fevereiro, pelas 18.45,  e 25 de Fevereiro pelas 12.00 hora. 

Hoje à tarde estive em directo no programa 'Agora Nós'  (RTP 1), a falar sobre o livro 'Doida não e não' com Tânia Ribas de Oliveira que deu quase vinte minutos de palco a Maria Adelaide Coelho da Cunha, ao longo de uma conversa excelentemente conduzida. 

quarta-feira, fevereiro 14, 2018

Loucos, sim, mas por amor

Entrevista ao Diário de Notícias da Madeira (11/02/2018).


 E estamos a falar de uma família da classe alta, com educação e formação. Afinal, mesmo nessas classes sociais, a mulher ainda era vista como um ser de segunda no primeiro quartel do século XX?
A mulher, em Portugal, só teve direito a voto depois de 1974, e isso diz tudo. Claro que ela usufruía de regalias que não eram para todas. Ia e vinha por onde lhe apetecesse. Até chegou a ter motorista particular. Mas em circunstâncias análogas, um homem divorciava-se e pronto. E depois casava de novo. E a ela, meteram-na num hospital de doidos...e podiam ter-lhe dado um tiro, com toda a impunidade, porque em casos de honra, os homens nunca eram criminosos. [...] 



terça-feira, fevereiro 06, 2018

Maria Adelaide vai voltar ao hospital Conde de Ferreira

Só quando se viu defronte do portão e dos muros altos que ainda hoje rodeiam o Centro Hospitalar, é que Maria Adelaide percebeu que a casa de saúde para onde o marido, o filho e um amigo de família lhe tinham pedido, insistentemente, para vir «descansar», era «o hospital de doidos». Nessa altura, conta, sentiu o coração parar-lhe no peito, o chão desaparecer-lhe debaixo dos pés e teve de fechar os olhos: «Meu Deus que horrível momento aquele! Estava à porta do Conde de Ferreira!» (em Doida Não e Não!



                                            

Entrada principal para o Centro Hospitalar Conde de Ferreira


Maria Adelaide vai voltar ao Conde de Ferreira, pela quarta vez. Da primeira, entrou pelo braço do filho, com o marido a acompanhar uns passos adiante, com o mais traidor e cínico dos amigos do casal. O inqualificavel dourtor Balbino Rego. Corria o ano de 1918 quando a teia da 'loucura' caiu sobre o seu destino. Mas nos primeiros meses de 1919, a 'louca' fugiu e levou outra 'condenada' com ela, a jovem Abecassis, riquíssima e sequestrada pela familia, como a Senhora de São Vicente e outras que por lá se encontravam a morrer em vida. Mas Maria Adelaide só conseguiu fugir, graças ao apoio inexcedivel do seu amante, Manuel Claro. Foi ele que encomendou a escada de madeira por onde se arrimou às traseiras do edificio, ajudando as duas senhoras a saltar o muro tão alto. Foi ele que arranjou o carro e a ajuda necessária para irem para o Rossão, distrito de Viseu, de onde  antigo motorista de Maria Adelaide era natural. E onde vivia a sua mãe, irmã e cunhados.

Da segunda, ainda em 1919, foi um tristíssimo regresso. Capturada por policias a soldo de Alfredo da Cunha, na casa de família e na aldeia de Manuel Claro, foi trazida de novo para a  'Bastilha'. As suas descrições dessa época apertam o coração mais duro... Mas voltou a sair, e desta vez de forma mais espantosa ainda. Pela porta da frente, em glória, de braço dado com o Governador Civil do Porto,e com o seu maravilhoso advogado Bernardo Lucas, que Manuel Claro, preso na Cadeia da Relação, contratou para defender Maria Adelaide. Em breve, teve de se esconder, e assim viveu durante largos tempos. Mas livre e junto de quem amava e que lhe correspondia com igual amor.

Da terceira, a Senhora de São Vicente voltou a entrar e a sair em grande estilo desta casa. Foi em 2012. Houve fotos dela e de Manuel Claro à porta do salão onde decorreu o primeiro congresso Luzes e Sombras do Alienismo em Portugal, promovido pelo então director clinico da instituição, Dr. Adrian Gramary. Eu fui oradora convidada, falei quase ao fim do dia, perante uma audiência estarrecida... e o texto da minha comunicação integra as actas do colóquio.  

Da quarta: a 28 de Fevereiro de 2018, Maria Adelaide vai voltar a cruzar os umbrais desta Casa. Mas agora, é a figura principal e única e tem direito a Salão Nobre. Por assim dizer, este evento vai ser quase um exorcismo. O convite será divulgado em breve. Fica o artigo do psiquiatra Adrian Gramary, de quem partiu a sugestão para o encontro e o debate sobre violências de género, na própria (e há muito tempo já). modelar instituição. O Centro Hospital Conde de Ferreira


Jardim interior do Conde de Ferreira


Crónica de um erro médico
Por Adrian Gramary

[...]
 No entanto, é necessário salientar um aspecto que o livro de Manuela Gonzaga, tão rico em pormenores históricos, se encarrega de esclarecer: ao contrário do que pudéssemos pensar, o caso de Maria Adelaide não foi um caso isolado, já que nessa época era relativamente frequente o internamento psiquiátrico das filhas descarriladas da burguesia e da aristocracia. Este procedimento constituía uma forma de punição que era vista como adequada perante comportamentos considerados desviantes entre os quais se incluíam os relacionamentos com indivíduos pouco recomendáveis ou de classe inferior. A autora do livro defende que o factor principal que determinou a repercussão histórica deste caso foi o papel fulcral que desempenhou a imprensa, que agiu como caixa de ressonância, facilitando que o caso se tornara vox populi. A isto soma-se a decisão da protagonista e do marido traído de saltarem à praça pública escrevendo livros e artigos onde tentavam argumentar os seus pontos de vista: «Infelizmente louca!» intitulou-se o libelo de Alfredo da Cunha e «Doida não!» a contestação de Maria Adelaide. Títulos exclamativos e melodramáticos que dão uma ideia das paixões envolvidas neste processo, talvez um dos primeiros escândalos mediáticos da história de Portugal, favorecido ainda pelo facto dos dois protagonistas fazerem parte de uma das mais conhecidas famílias ligadas à imprensa do país. A história, porem, teve um final demorado, embora mas mais... [...] 

Para ler o artigo na íntegra:
http://www.saude-mental.net/pdf/vol11_rev3_leituras.pdf





quarta-feira, janeiro 31, 2018

Maria Adelaide Coelho da Cunha - história de um amor (quase) impossível

O que se faz quando se está tanto tempo de costas voltadas para o nosso bloque predilecto? Atalhando motivos, vou directa ao assunto: estou de volta aos livros (quase) a tempo inteiro. E a Bertrand Editora deu-me uma grande alegria ao decidir relançar em edição revista um livro que esgotou depois de várias edições e de um grande sucesso editorial. Para nosso grande espanto e alegria, a obra está a ser muito acarinhada em termos mediaticos. Um grande artigo na Revista Máxima de Fevereiro; sete páginas no Notícias Magazine de 30 de Janeiro, uma entrevista na Time Out... e não fica por aqui. Aliás, já está traduzido e vai ser em breve lançado no mercado francófono por Le Poisson Volant.